quarta-feira, 25 de julho de 2007

Trem das 9:47


"Eu passei por você sem que pudesse vê-la, só depois vim descobrir...
Foi seu último dia, só depois consegui entender...
Eu passei pela vida sem deixar rastro algum,
por andar rápido demais, desaprendi a acordar"


Eu passei pela vida sem deixar rastro algum,
Por pegar sempre o trem errado, num terminal que nunca existiu
Eu passei por você sem que pudesse vê-lo, só depois vim descobrir...
Foi seu último dia, antes de eu partir,
Só agora consegui entender...
Vivi num sonho, mas nunca aprendi a sonhar.


(Rômulo - Patrícia- 9:47)

segunda-feira, 23 de julho de 2007

Fim do dia...

Subia as escadas com esforço. Já no primeiro lance queria parar. Atravesso o corredor escuro. Chegando ao final, acendo as luzes. Abro a porta querendo encontrar alguém, não tem ninguém. Desabo. Minhas pernas já pareciam não me agüentar. Na cama o quarto gira ao redor de mim. Lá fora o mundo parou, pelo mesmo é o que penso. Na verdade nem penso isso. Sinto a falta de tudo, ignoro o lá fora.
Em meio à sonolência, pareço estar paralisado. Realmente estou. Sinto apenas o sangue correndo de um lado pro outro, sinto as batidas fortes no peito. Como fui ficar assim? Na verdade já não penso mais em mim.
Sinto um gosto podre na boca. Sinto as coisas agirem sobre mim. Penso agora no abajur, em como ele fica bem no quarto. Quando o comprei apague todas as luzes e fiquei deitado à meia luz. Fiquei ali parado, pensando. Na verdade não pensava em nada. Ficava olhando pro quarto a meia luz.
O abajur é daqueles simplezinhos. Tem uma base que madeira, assim quadrada, com uma armação comprida coberta com pano de saco, sabe esses rústicos? Gostei do estilo. Já na loja pensei que fosse ficar bacana com as lâmpadas; essas amareladas, tinha umas quadro sem uso.
Pensei em acender o abajur, ta tudo escuro. Não acendo. Paro de pensar no abajur. Sinto-me adormecer.
Acordo. Com a batida forte no peito. Acordo assustado. Mesmo assim nem me mexo. Sinto o ar correndo no quarto. Ele mexe a porta. Para frente e para trás, mas ela está fechada, sabe? Mas faz barulho. Depois para. Sinto um bichinho caminhando. Acho que é uma baratinha, mas não olho. Dessas que são filhotezinhos. Penso que deve haver maiores, mas não faço nada. Adormeço.
Acordo. Acordo com dor. Não sei quanto tempo passou. Penso no pó que junta aqui. Penso que isso atrairá mais baratinhas. Sem me mover. Durmo. Acordo. Com as ultimas batidas. Um pouco antes, lembro de que tinha sentido um cheiro podre, assim meio dormindo mesmo. Já não sinto mais as batidas.


Ilustração de Jean Michel Basquiat

quarta-feira, 18 de julho de 2007

Crise Criativa Coletiva...



HINO DO INFERNO CRIATIVO
por .patrícia

Há três dias eu escuto a mesma música.
Estou surda de tanto pensar no que estou pensando.
Passando por caminhos pintados com tintas incolores de inverno.
Passando roupas, podando plantas – explodindo céus internos.
Há três dias eu pesquiso em livros proibidos que língua eu falo – que fardo eu carrego.
Estou muda de tanto catar palavras ainda não ditas – conceitos não formulados.

Maus tratos nos cabelos.
Maus atos.
Maus sonhos, de sonhos acordados.

Não acho.

O invisível tem me perturbado.
Não acho – porque cega procuro.
E se eu visse, não sentiria a importância dos olhos.
Não enxergo.
Querem que eu seja agora o que eu quero ser no futuro,
Mas, eu preciso adiar a minha vida como preciso dela para viver...

sábado, 14 de julho de 2007

Quando o Amor acaba...

por Gafa (blog Mundo Gafa)
"Amar não é coisa para amadores." Milôr Fernandes

No inicio, ahhhh, no início! Era bem assim, ela me amava e EU sentia isso. EU via em seus olhos e em seu sorriso e em sua respiração. Tínhamos sintonia. Bastava ela me ver e estava tudo aí. E, quer saber? Era recíproco! Assim como ela me amava e EU podia sentir isso, ela também podia ter certeza que EU a adorava. Podia não lhe dizer assim, com todas as letras, mas bem, como diz aquela frase-feita "um gesto vale mais que mil palavras". E não se pode dizer que EU não era carinhoso com ela. Estava sempre à sua volta, nos divertíamos à beça, eu dava mordidinhas de brincadeira, ela me acariciava atrás da orelha, tipo quando dá aquela coceirinha, sabem?!, de volta, lhe dava uma lambida na bochecha, ela fazia cara de "noujeenho" de brincadeira e desatava a rir disso... enfim, éramos um par perfeito.Logo de cara, tive problemas com os pais dela. O Pai, homem da casa, tinha de manter sua pose. Não falava comigo. Aliás, fazia o possível para nem estar no mesmo cômodo da casa que EU estivesse ocupando. A mãe, bem, ela falava mal de mim o tempo todo. Sempre que podia falar algo pra me maltratar, fazia questão de dizer. Eram unânimes quanto serem contra minha chegada na família, assim como falei. Mas tiveram de se conformar, visto que nosso amor era bem maior que suas ressalvas. Por fim, tiveram de aceitar. Ainda assim, nada de ir pro quarto dela, não senhor. Muito menos, deitar em sua cama! E mesmo eles não estando em casa, não convinha fazê-lo, podiam descobrir. Seria pior, pra ela e pra mim.Porém, as coisas foram mudando... não sei quando começou isso e nem por que, mas o tempo foi passando e ela já não tinha tanto prazer na minha companhia... já não fiava comigo em todas suas horas livres. E EU me sentia triste. Tudo bem, uma coisa ou outra errada EU fiz talvez... tinha ciúmes dos amigos dela, pra bem da verdade, me desentendia quase sempre com eles. Ela me dizia pra que não fizesse assim, mas não tinha jeito. O sangue subia, ficava com inveja e os atacava. E isso a chateava, EU sei... Mas também sentia que a estava perdendo. Que outras coisas entravam na vida dela e que EU ia me tornando um mero coadjuvante, ao fundo, sem falas, perdendo a interação. Não sabia o que fazer para reparar isso. Aliás, tudo que fazia, parecia errado. Sempre que tentei chamar a atenção, e que antes, ela adorava, agora me repreendia, dizia que EU não tinha mais idade pra fazer isso, e nem ela pra aturar esse tipo de coisa. EU estava ficando louco. meu coração aos poucos, despedaçava-se.Por fim, reuni o resto de dignidade depois de nossa última briga e, com lágrimas nos olhos e pesar no coração, me fui embora. Dizem uns que ela ainda me procurou uma semana ou duas, porém, se EU voltasse, ainda assim, as coisas não seriam como antes. Hoje sou um oco, mendigando carinho à volta dos outros. Se me perguntarem, sim, EU tenho vergonha, mas é o meu destino. E, por mais que EU tente, suas ultimas palavras não saem da minha mente:
- Rex, cachorro mau, pare de tentar comer meu ursinho de pelúcia! Será que vou ter que e prender pra sempre num canil?!


Era como um cão reprimido
oprimido, sem sentido
depois do amor,
era ele, ninguém
um alguém
sem amor.

por: Ana P. Risos

quarta-feira, 11 de julho de 2007

Mau Humor

Por muito tempo de minha vida, todas as manhãs, acordei com um terrível mau humor. Sempre achei que isso fosse parte da minha personalidade, não costumo ser ríspido, nem grosseiro, mas pela amanhã era assim que agia. Daquele tipo que não dá bom dia para quem vê pela manhã, e que demora um tempo até despertar e manter um diálogo. Sempre achei que tivesse a ver com meu relógio biológico, afinal, não gostava de levantar cedo, nem de ser acordado. Despertava com os sons dos pássaros, e o silêncio quase musical das manhãs, e tudo aquilo me irritava. Concluía que fosse algo natural em mim, e as pessoas precisavam entender, “foi mal, eu acordo mal humorado”. E sempre me conheci dessa forma.
Com o passar do tempo, o girar da vida e dos acontecimentos comecei a perceber alguma coisa diferente. Esse tal mau humor de que falava não estava presente em dias mais belos em que amava acompanhado. Parecia-me um tempo feliz, mesmo em meio a caminhões dando ré na minha cabeça, não me lembrava mais da sensação de acordar de mau humor. Nunca parei pra pensar ao certo o que acontecia. Hoje acredito que isso tenha a ver com algo inconsciente, relacionado diretamente com momentos especiais da vida, em que vemos desejos realizados e o vazio preenchido, "a felicidade é quando a dor passa". O mais incrível é que só percebemos essas coisas quando elas mudam. Quando passam. Ultimamente tenho acordado de mau humor.


Na ilustração:
Diomedes: "servimos mais ou menos, pra servir de vez em quando" (de L. Mutarelli)

quinta-feira, 5 de julho de 2007

Dentro dos pirulitos de coração...


Não quero dizer nada
Nada. Não quero dizer.
(Nada? Ou não quer me dizer?)
Dizer nada... Não quero.
Quero dizer nada, não.
Não. Nada. Quero dizer...
(Não quer dizer?)
Dizer? Quero!
Não, nada...
(me diz?)
(me ama?)
Não.
Mas quero!
Dizer...
Nada.
Amo sim.
(mentira...)
Não.

quarta-feira, 4 de julho de 2007

Grossas nuvens perfuram raios de sol

Estou na esquina como um valete de copas. Intranqüilo, fumo um cigarro e puxo o tricô da sacolinha de plástico. Tranço as agulhas, desenozando a lã milimetricamente arrumada no novelo por uma máquina moderna de 1898. Quanto mais desfaço, desentrelaçando e pondo em duas retas paralelas metros e metros de lã, maior fica o meu blusão. Quase já nem serve em mim, de tão pequeno. Espero a chuva, que se anunciou num clarão de luz no horizonte, mas que logo se foi quando as nuvens negras, pesadas e grossas se ajuntaram sobre o lago, espelhadas num céu azul de anil. Não tem movimento na cidade deserta. Mais um carro passa a mil por aquela reta. Espatifa-se no muro e continua andando sem diminuir a velocidade. O motorista acena para o vazio, mandando, sorridente como em sua noite de núpcias, ninguém tomar no cu, e é vaiado pela platéia que comparece, alinhada e rota, àquela cerimônia fúnebre. O carro se vai, espalhando fumaça e poeira do asfalto, contornando a praça do centro da cidade em que a periferia toma conta, bebendo cachaça. Ao som da sinaleira da Leonel Mosele com a Marechal, dançam salsa, e com suas roupas de pingüim, esvaem-se em contorções de valsa. Sobre o imenso capim da praça, rente ao chão, as gralhas simulam o primeiro vôo, uma batida estratégica de retirada, voltando ao ninho para matar a saudade de um lugar que nunca saem. Sacodem as penas de pele de porco, os ossos de porco, os focinhos de porco, e gralham, correndo, com as patinhas cravadas no solo, como doidas, atrás de comida: um bife acebolado do cartaz da churrascaria que vende pizza. Não se importam com a não resposta ao seu gralhar e se preocupam ao ouvirem o eco do som que fizeram naquele silêncio sem fim. As gralhas, em vôo, recortam o sol e perfuram a noite imensa e vazia. No solo, ouvindo o estrondo da cidade em agitação, enquanto Mozart seleciona Bee Gees no alto-falante da igreja, homens, mulheres e crianças correm de um lado a outro, procurando-se. Ao se encontrarem, retiram dos bolsos, carteiras e pastas, espelhinhos, e acendem imensos charutos para celebrar o renascimento. Depois voltam a correr; batem-se uns nos outros, desviando-se. Os mais pesados, fortes e gordos gemem de dor. Os menores e mais leves, aprumam-se e estufam o peito, impondo respeito. Miúdos, os gigantes soluçam de alegria ao oferecerem a mão para ajuntar os mais fortes, e os puxam para baixo, enterrando-os cada vez mais nas calçadas. Somente com as cabeças de fora, reviram os olhos, esticando as pernas, e assim, ali, sem quase se mover, giram o mundo com um pequeno esforço, enquanto de suas testas pingam gotas de suor e sangue. Como um ás de espadas, molemente intranqüilo, espero alguém passar com o guarda-chuva aberto, para me dar carona: quero voltar aonde estou.
*
por Rubens Lunge

domingo, 1 de julho de 2007

"No tempo da minha infância, éramos amigos de um guarda-chuveiro. Consertava varetas e trocava panos o seu Antonio (eu-menino nunca compreendi porque aquele pano não se encharcava todo). Hoje em dia, mal a garoa nos surpreende, alguém oferece um guarda-chuva novo, por cinco reais ou menos. Talvez, este que vive com pouco, seja um dos últimos da sua profissão"
Texto de Mário Rui Feliciani, fotografo, na exposição "... e um pouco das pessoas". Na foto seu Antonio consertando guarda-chuvas.
Mecânicos de Guarda-chuva” nasceu inspirado no fanzine “Quando o Amor Acaba...*”. Da mesma forma que ele, viemos falar das coisas que acabam. Como nosso amigo guarda-chuveiro, que na modernidade vê sua profissão acabar-se, pensamos ser como mecânicos de coisas pouco valorizadas, tidas hoje como arcaicas. Insistimos em falar e acreditar nas coisas que passam, as idealizamos, eternizamos; como esculturas prolongamos sua existência. Na verdade, tratamos aqui de eternizar nossos desejos; não é puro delírio, nem romantismo involuntário. Esse é nosso espaço de querer.
Não deixamos de indagar o caos, nem debochar da seriedade das piadas da vida. Aproveitamos para esvaziar a mente do tormento, e dividi-lo. Choramos as ilusões perdidas, os planos desgraçados, lamentamos, fracassamos. O mais curioso é perceber a cada entrelinha um pouco de esperança, mergulhada em desespero bem verdade, mas que torna tão interessante esse movimento de ilusão e criatividade.
Vamos todos juntos.
Seja Bem vindo(a).

* Quando o Amor Acaba... é uma publicação independente de pessoas que tem amor pela literatura e as artes.