sábado, 15 de março de 2008

A insanidade não tem nome

na cidade onde nasci
há uma lenda sobre
uma cor:
“preto chumbo”

mas e “preto claro”, existe?
- não seria cinza
escuro?


Às vezes ele tinha barba. Dizia, toda vez, insanidades que explicavam os passos tropicados que dava. Tenho me ferrado tanto que brota uma inspiração doida, é a vida! - Ele dizia toda vez. Eu dizia - Nem percebo mais as ferradas... Me ferrar, respondendo jornalisticamente, é muito importante para mim. A coisa constante que varia de ofício para ofício – Mais ossos que saudades. - Parece que gosto de me ferrar - Me dizia.
9:17, avisou. - Estou terminando um textinho, acho que publico em meia hora...- Quero ler, li teu passado - Atualizei a memória - Será que me perdoa pelo descaso?
- Li teu comentário - Ele me disse. Acertei, porque ele concordou - É mesmo um desabafo de dor de amor, inegável - Me dizia - Eu acho que no fim, eu temo tanto a resposta, que eu mesmo a antecipo e contagio a pessoa que me responderia. - Eu faço isso sempre - Eu disse - E fico sozinha. Dá vontade de me dar um soco. Ele, na mesma confusão que a minha - Vamos nos agredir um ao outro, dois teimosos - Sugeria.
Sabe o que é...? - Eu me explicava em desculpas - Eu me expresso por detrás da cortina e quero que me vejam... Eu me pergunto: Como vão responder se eu não pergunto? Eu explico - É como se eu já soubesse a resposta. Então eu mesma respondo.
Às vezes, eu não sabia como ele era. Mas ele dizia - É mais ou menos isso comigo, só que eu teimo em não aceitar a resposta que eu mesmo inventei. Eu concordei - É...exato. Isso também acontece...Eu acho que deixo as pessoas loucas. Daí fogem de mim, como eu mesma faço.
- Exato, eu assusto as pessoas - Ele dizia, e perguntou - ... é você na foto, ou o Andy Warhol quando jovem? - Eu e uma capa da Rolling Stone – Eu disse - Achou parecida? - É que está pequena e não dá pra ver tão bem...
Ele tem uma boa imaginação para catar tangentes.
É – Eu dizia - ...pensando pelo lado dessa semelhança, é melhor mesmo eu seguir minhas respostas...Andy Warhol, quando jovem, devia ser mais feio do que era quando idoso e cheio de reumatismos.
- Ele já nasceu um maracujá de gaveta, então? – Ele dizia (e devia rir da situação), e continuava - tipo o Mick Jagger, mas numa versão piorada? Não – Eu respondia -, a versão piorada sou eu.
É nada – ele disse.
Melhor mudar de assunto. Anticrítica de baixa auto-estima é coisa de gente fraca.
Meu texto está tão otimista que acho que vou jogar fora – Ele continuava. Minha vez, e lembrei - Cara, ontem caí da escada na faculdade, foi emocionante. E ele ainda no passado da palavra - Mas gosto por ser uma contradição ao que dizem de mim: que escrevo só coisas tristes... Só escrevo coisas tristes? – E continuou - Tu te machucou, sua desastrada?
Pior que não. Nem bati direito a bunda - Eu já sou especialista, cara...Não é bem assim, cair e se machucar - Sou profissional...
Olha – Eu disse - tenho que te contar uma coisa: Ontem foi a primeira aula na frente da câmera...Tu vai fazer jornalismo, né? Eu me senti uma banana, não saía nada. E ele dizia - Vou, mas quero distância de câmeras. Eu continuava - Todo o meu cérebro congelou. Eu não sei o que falei. A boca mexia, saiam as palavras. Eu estava de olhos abertos, mas não enxergava. E eu falava, falava - Acho que sou individualista de mais pra isso. Minha condição de invisível se desnorteou, sabe... – E ele só pensava - foi como se tivessem me vendo limpar a bunda depois de cagar. Ele riu.

... E os farelos de pão foram com o vento, a procurar por aí, o bico de algum passarinho.
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Um comentário:

Jorgito disse...

Expondo nossas fraquezas conjuntas? Muito bom, bela surpresa... agora vão poder saber realmente quem (não) somos.