
na imagem: Buster Keaton
Distanciando. Eu percorro devagar as ruas que chamam meu estado de espírito. Abrem-se clarões para que os devaneios passem em esferas rápidas. Minha mente cansa, mas precisa encontrar as referências que me cabem. Um assunto, apenas. É o que eu quero. Algo fácil de ter, levando em consideração o bombardeio de informações ouvidas, lidas, assistidas, compradas, inventadas – gratuitas.
Fácil como ouvir, mas não escutar. Ler, mas não entender. Ver, mas não enxergar. Comprar, parcelar e não pagar. Acreditar, sorrir, mas não sentir. Ganhar, guardar e esquecer - Simples como a rotina. Sistemático. Imperceptível. Talvez, porque superficial.
Eu quero o assunto e posso escolher qualquer um. São todos meus. Mas, eu não consigo. “Eu não consigo” – Ponto – E, palestrantes motivacionais, com aquela doença do otimismo crônico, que não venham criticar essa frase. Essa, que concede o charme para todas as situações da minha vida, ou quase. Insuportável é aquela coisa de “Sim, eu posso!”. Prefiro deixar essas encrencas para a pseudo-literatura auto-ajuda de Paulo Coelho, que pelo menos disfarça bem...
Minhas referências moldam minhas incoerências. Os acertos comprados, os mal pagos. Os ganhos e as perdas. Os erros que me embalam e me governam; me cegam e me acordam. Contraditórias, as referências. As minhas - Plágios suspeitos, sutis, de pensamentos. Plágios com referências bibliográficas de grandes obras, ou não. São as referências disseminações de pesquisas e de nervos. São o produto da escolha e do trabalho sobre algum assunto, de alguém que, um dia, quis se tornar referência. Ou, são apenas referências: Deitadas nas ruas, escoradas nas esquinas, estacionadas em frente à farmácia. Uma cor, um consultório, um crítico, um psicólogo. São apenas referências. Na música, na arte, no cinema, nos livros, nas pesquisas científicas. Cada área com as que lhes faz parte. E eu aqui, tentando achar as minhas para conseguir o assunto do dia.
Um assunto - eu o procuraria pelas minhas divagações, se não fossem em forma de rizomas malandros; enganosos, afoitos e escondidos em mim, por mim. Assim, não o encontro. Não penso nos livros que já li, porque a maioria ficou pela metade, e eu não saberia desdobrar o possível tema, tirado deles, até o fim. Preciso de uma referência. Talvez alguém que tenha lido muitos livros até o final e, além disso, saiba falar sobre. Alguém que me lançaria um desafio com um assunto sem sentido, se sozinho. Um assunto que me deixaria sem argumentos, mais enrolada que as minhas divagações...
Não, pensando melhor, isso não seria uma boa idéia, seria o ápice do desamor-próprio. Não vou pedir a ninguém palpite algum. Tenho minhas músicas, meus filmes, meus gostos gastronômicos. Tenho um mapa da cidade, acesso à biblioteca, explanações diárias de professores. Não sei para quê tanto alarde por causa de um assunto. Tenho mentiras imaginárias, um segredo de Estado, estratégias de guerra. Tenho todas as referências para uma boa escolha. Então, por que eu não resolvo isso de uma vez?
Pois é, eu também não sei. Mas, se não for preguiça, deve ser algo bem parecido. O meu medo é que esse seja o meu estado de espírito. Uma conduta que não acompanha a velocidade com que minha imaginação passa pelos clarões que se abrem. Sempre perco a idéia antes de grudá-la em algum papel. E a idéia se vai...Ou se esconde, como minhas referências. Sei que existem à distância. Que se distanciam mais e mais. E vai chegando a hora de entregar o trabalho, e eu não consegui sequer o assunto para começar. Continuo percorrendo as ruas devagar, quase parando. Parei. Cansei de pensar – Vai ficar para outro dia.
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