
imagem: .patrícia
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(...)"Não tinha consciência de que lado da cidade eu estava. Nem se voltaria. Sabia, contudo, que estava em baixo de algum prédio, de algum restaurante, de alguma casa, de alguma coisa. A coisa mais ao lado que havia era o meu pressentir da presença do velho. Quanto mais passos eu dava, mais chorava a minha covardia, na lama. Eu parecia um desenho animado, desses com histórias mirabolantes de monstros e coragem. Estava para rever o monstro, mas a coragem jamais havia aparecido.
Entre as perguntas que não pairavam sobre o ar, mas invadiam minha mente e desnorteavam o meu tempo, estava a que questionava a sobrevivência desse meu amigo monstro. Há sete meses o vi pela última vez. E, ao contrário do que eu disse na semana passada, sabia que a chuva nada levava para ele se alimentar. Eu desejava, com esperança, que ele fosse deveras um verme. Se humano, como contraditoriamente sei que seria, a taça do meu egoísmo cairia. Em pedaços pontiagudos se juntaria ao vento e viria com a velocidade alcançada num vendaval, a penetrar por todo o meu corpo. Perfuraria cada órgão. Eu tinha medo de uma criatura da mesma espécie que a minha - que eu imaginava ser. Queria que ele fosse um verme, muito. Ou, o meu egoísmo se espatifaria com a consciência desgraçada de não o ter reconhecido e, portanto, não reconhecido a mim mesma.
Apertei com mais força meus joelhos sujos e esfolados pelos tombos de antes, com medo de que o medo não me desse lado – não me pegasse pela mão. Estava no limite.
Os sete meses mal passados rondavam com as figuras da escuridão, minha cabeça. 360 graus. Não houve sequer um dia em que o velho não tivesse passado por ela, rindo aquele riso desdentado e ridículo. O velho tinha que estar vivo, eu pensava. Torcia para que ele não precisasse comer, beber e o resto. Que fosse um verme divino. Que fosse um verme secreto. Que me respondesse sem abrir a boca e me privasse daquela angústia transformada em tentativa de comunicação. Que se fizesse entender pelo olhar profundo e morto, que alimentava com a própria fome. Torcia, sem movimentos ou resmungos. Torcia me universalizando com o silêncio ambiente. O som dos mortos, ou o alívio dos vivos.
“A vida é feita de escolhas”, a mãe dos vivos diz. Então, decidi continuar".
Entre as perguntas que não pairavam sobre o ar, mas invadiam minha mente e desnorteavam o meu tempo, estava a que questionava a sobrevivência desse meu amigo monstro. Há sete meses o vi pela última vez. E, ao contrário do que eu disse na semana passada, sabia que a chuva nada levava para ele se alimentar. Eu desejava, com esperança, que ele fosse deveras um verme. Se humano, como contraditoriamente sei que seria, a taça do meu egoísmo cairia. Em pedaços pontiagudos se juntaria ao vento e viria com a velocidade alcançada num vendaval, a penetrar por todo o meu corpo. Perfuraria cada órgão. Eu tinha medo de uma criatura da mesma espécie que a minha - que eu imaginava ser. Queria que ele fosse um verme, muito. Ou, o meu egoísmo se espatifaria com a consciência desgraçada de não o ter reconhecido e, portanto, não reconhecido a mim mesma.
Apertei com mais força meus joelhos sujos e esfolados pelos tombos de antes, com medo de que o medo não me desse lado – não me pegasse pela mão. Estava no limite.
Os sete meses mal passados rondavam com as figuras da escuridão, minha cabeça. 360 graus. Não houve sequer um dia em que o velho não tivesse passado por ela, rindo aquele riso desdentado e ridículo. O velho tinha que estar vivo, eu pensava. Torcia para que ele não precisasse comer, beber e o resto. Que fosse um verme divino. Que fosse um verme secreto. Que me respondesse sem abrir a boca e me privasse daquela angústia transformada em tentativa de comunicação. Que se fizesse entender pelo olhar profundo e morto, que alimentava com a própria fome. Torcia, sem movimentos ou resmungos. Torcia me universalizando com o silêncio ambiente. O som dos mortos, ou o alívio dos vivos.
“A vida é feita de escolhas”, a mãe dos vivos diz. Então, decidi continuar".
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