quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Espaços e Projetos

DO TRIPÉ: PROPOSTA, AÇÃO E PLATÉIA

Nem sempre com o terceiro pé, a Cultura na cidade do trabalho é fomentada, prova que existe e, aos poucos, vai agregando interessados aos desafios das artes

Os espelhos que forram a parede bege da sala fiscalizam os passos marcados pela dança. Três andares acima da rua Abramo Eberle, oito meninas entre sete e nove anos dançam, numa quarta-feira à tarde, embaladas pelo som da música popular e folclórica. -“Bruna, lá Bruna!”, indica a professora Claurice Maura Zolet, há dez anos na Fundação Municipal de Cultura, à uma delas. A cena, longe dos olhos da população enquanto ensaio, não é um evento cultural isolado em Concórdia - região Oeste de Santa Catarina (SC). Há som para a dança, tom para a música, palco para o teatro, bengalas para o cinema, espaço para artistas e três instituições fomentando, como parceiras, a produção e o desenvolvimento local. A Fundação Municipal de Cultura (FMC), o Serviço Social do Comércio (SESC) e o Memorial Attilio Fontana educam, inovam e ensinam.



Criada em 1989, a FMC é constituída pelo Teatro Municipal Maria Luiza de Mattos, pela Casa da Cultura Eliseo João Zanatta, pelo Museu Histórico Ermano Zanoni e pela Biblioteca Pública Municipal João Costa das Neves, hoje com 20 mil exemplares à disposição. Segundo a superintendente, Dalva Pichetti, a Fundação tem, entre outras finalidades, planejar, colaborar, promover e executar a política do desenvolvimento cultural de Concórdia. Ali, há espaço para lançamento de livro, workshop, mostra de fotografias e obras de artistas plásticos, além do palco para o teatro, o incentivo à leitura e as oficinas gratuitas para os Concordienses.
Dalva conta que, entre as atividades, as oficinas são uma proposta “grandiosa”. Hoje, cerca de 400 alunos, de sete a 70, 80 anos, participam de aulas de dança, ginástica, guitarra, violão, teclado, acordeom, piano, teatro (artes cênicas) e artesanato, de fevereiro a dezembro. E o evento da folia também é pautado pela Instituição. “O carnaval também compete a nós. É um dos maiores eventos do município, porque as pessoas apreciam. Uma tradição, inserida numa das mais populares e maiores festas culturais do Brasil, de todo ano: carnaval e futebol”, acrescenta, lembrando o clichê.
Dos projetos, o “Circulando por aqui” descentraliza as atividades e percorre Escolas Públicas do Município e também comunidades do interior, apresentando as várias atividades Culturais das oficinas da Fundação Municipal de Cultura.
A superintendente cita também o “Mundo sobre rodas”, que relaciona à temática toda a produção, inserindo os vários segmentos trabalhados. “Este projeto fala do cuidado que se deve ter no trânsito, e dentro desse contexto, fundamenta produções com a música, o artesanato, a dança”, comenta.
Outro projeto, o “Quinta Maior”, desponta como um espaço aos talentos, locais e regionais. “Ele dá oportunidade não somente aos professores e alunos daqui, mas a todas as pessoas que têm alguma coisa para oferecer. Seja lançamento de um CD, mostra de obras ou fotografias, discussão e apresentação nativista, e também da Orquestra Sinfônica”, explica. O ingresso para o Quinta Maior, lembra Dalva, é de um quilo de alimento não perecível.
O projeto da Fundação que tem o maior público, formado pela sociedade em geral, é o que promove a voz e o “gogó” dos “filhos” do município. O “Canta Concórdia” já lotou a casa várias vezes. “A sociedade gosta. Gostamos de ver pessoas com quem temos ligação (filhos, amigos, colegas de trabalho) em uma situação diferente”, considera Dalva, como motivo da lotação da Casa com o Festival.

Concórdia aos galanteios do SESC

Como um romântico tímido que estuda meticulosamente uma forma eficiente de se fazer visível e atrair a amada, o SESC vem refletindo, desde 1999, que estratégias ainda não utilizadas conquistariam o coração do público concordiense. A diferença da comparação é que, de tímido, o SESC não tem nada. Menos ainda, as propostas e as atividades dele. Acreditando que esse “coração” também não seja de pedra, a gerente da instituição em Concórdia, Adriana Cadori Gusmão, aponta que já é possível notar uma “quedinha” por parte desse “público difícil”. “Viemos observando um crescimento gradativo, em pequena escala, de pessoas participando - interessadas”, conta.
Segundo ela, Concórdia tem um movimento cultural interessante, embora ainda haja bastante a fazer. “Temos muitas pessoas a conquistar, para que prestigiem os eventos de cultura. Não só do SESC, mas dos que são promovidos em geral, na cidade”, analisa.
Tanto em Concórdia como no Estado, o Serviço trabalha com todas as linguagens culturais. Artes cênicas, literatura, artes plásticas, teatro, música e dança. Adriana destaca que o objetivo é fomentar a cultura, priorizando o produto que geralmente não está na mídia, e que tem uma qualidade especial. Outra questão que levanta é que os mesmos espetáculos, projetos e ações são oferecidos em todas as cidades de Santa Catarina, onde o SESC está instalado.
No teatro, trabalha com o projeto “Palco Giratório”, que completou 11 anos este ano e percorre mais de 70 cidades no território nacional. Em nível de Estado, o “Em cena Catarina” rouba a cena pelos palcos das cerca de 20 cidades, por onde passa. Em música, o SESC trabalha o projeto “Sonora Brasil”, que tem abrangência nacional e o “Circuito Catarinense de Música”, que é do Estado.
Acompanhando essa produção musical, as artes visuais são contempladas com o projeto “Pretexto”, desenvolvido em Concórdia há mais de quatro anos, em parceria com o Memorial Attilio Fontana. E, o “Casulo” para os jovens artistas, também com a proposta de valorizar e incentivar a arte plástica.
Na literatura, o “Formação de Escritores”, iniciado no ano passado, teve continuidade em 2008. A proposta de reunir escritores do município, desconstruir formas, conceitos e promover maior conhecimento literário e de percepção aos participantes, resultou, da primeira edição, num caderno de autorias, chamado “O Livro das Epifanias”, lançado em outubro. Da palavra escrita à falada, o SESC não deixa faltar opção. O “Baú de Histórias” resgata o hábito de sentar e ouvir contos. Prática que vem se perdendo em meio a tanta tecnologia. “Além desse”, ressalta Adriana, “tem a formação dos contadores de histórias também e o projeto ‘Sábado tem História’, que é mais uma parceria com o Memorial”.
E, para os amantes da “sétima arte”, o projeto “Cine SESC” é realizado toda a primeira quarta-feira do mês, com filmes brasileiros e internacionais. A gerente comenta que há uma grande quantidade de material e, se procura acrescentar ao assistir, o refletir, interpretar e criticar. Tanto o SESC quanto a Fundação Municipal de Cultura trabalham com as atividades sistematizadas, oferecendo as oficinas em todos os segmentos culturais.

Um Memorial que não vive só de lembranças

Para sustentar propostas e ações, o Memorial Attilio Fontana, inaugurado em 2000, é um instrumento de apoio, que valoriza as iniciativas e os artistas de diferentes segmentos. A historiadora e coordenadora do museu, Sandra Mara Roman, explica que o espaço não se permite limitar, porque tem como discurso o diálogo entre a produção local e a de fora do município.

“É necessário abrir os olhos e ver novos horizontes”, afirma Sandra. E confirma: “Ser um palco só para expoentes externos é um limitador e um inibidor local”. Por esse pensamento é que se encontra, nas participações e trabalhos expostos no Memorial, o equilíbrio.
Ela conta que, embora as exposições com artes plásticas sejam o “carro-chefe” da instituição, outras iniciativas na área musical, da narrativa oral e do teatro são “vertentes da arte” possíveis através do museu. Segundo ela, a participação da sociedade, entretanto, é relativa. “Avaliamos como positiva. Existem atividades em que a adesão é muito grande, que temos o problema de espaço, que superlota e é até ruim. E existem atividades em que vemos que a presença poderia ser bem melhor. Mas entendo que é um trabalho contínuo e considero um formador de platéia”, analisa.
Sandra ressalta que a formação de platéia não ocorre só nas apresentações de música ou teatro. Em oito anos, ela comenta que não houve interrupção de atividades. “Acredito que a instituição já mexeu muito na concepção das pessoas, e talvez de uma forma quase sem que se percebesse. Vejo que as crianças vão muito. As escolas realmente participam das exposições. Os professores são muito preocupados com essa vertente, com esse novo horizonte”, completa.
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Parte de Reportagem para Impresso III, curso Comunicação Social - Jornalismo, Universidade do Contestado - UnC, 2008.

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